Sociedade de Estudo Psicanalítico Contemporâneo

... Confiabilidade, comprometimento, contentamento do cliente, transparência, ajustamento, ética e valorização do profissional, estas são as propostas da SEPC. Atuando como Referencia de nobreza da Psicanálise.

"A aceitação de processos psíquicos inconscientes, o reconhecimento da doutrina da resistência e do recalcamento e a consideração da sexualidade e do complexo de Édipo são os conteúdos principais da Psicanálise e os fundamentos de sua teoria, e quem não estiver em condições de subscrever todos eles não deve figurar entre os Psicanalistas".

Sigmund Freud



quarta-feira, 16 de junho de 2010

A mente e o corpo

         
          A Psique está ligada ao soma, isto é ao corpo. A mente e o corpo formam uma unidade, constituindo partes integrantes do ser humano, podendo a psique ser a origem principal de certas disfunções, assim como estas podem motivar perturbações psíquicas, portanto não existe isoladamente corpo ou mente, pois esta é uma função do cérebro que é por sua vez uma parte do soma.
          Hipócrates já postulava, há 5000 anos a.C, que para que as curas obtivessem sucesso, necessário seria que os médicos tivessem “um conhecimento da totalidade das coisas”. Sócrates retornou da sua temporada no Exército advertindo aos seus compatriotas gregos que, em certo sentido, os bárbaros estavam na dianteira: ele sabia que o corpo não podia ser curado sem levar em conta a mente.
          Martinho Lutero, no início do séc. XVI, declarava: “Pensamentos soturnos (sombrios) acarretam males físicos; quando a alma está oprimida, o mesmo acontece com o corpo”. Ele tinha uma preocupação doentia com sua saúde. Por toda a sua idade adulta sofreu de constipação.
          Já dizia Platão: “a cura de inúmeras doenças é desconhecida dos médicos pois eles ignoram o conjunto, e isto porque uma parte jamais poderá estar bem, a menos que o todo esteja bem.”
          A fim de aliviar a tensão que lhe é imposta pelos conflitos reprimidos, o inconsciente pode expressar-se por meio da linguagem fisiológica. (funções orgânicas); Trata-se de não só um simbolismo como também de um esforço no sentido de solucionar um problema ou satisfazer uma necessidade. Infelizmente, não sendo este um processo racional, o problema da pessoa permanece insolúvel e a sua necessidade não é satisfeita – as alterações físicas a tornam doente (Howard R-Martha E. Lewis). A simbologia correlacionada aos sintomas é sujeita a uma grande variação. Uma de suas formas é o que se chama de “parte para um todo” em que cada órgão individual é capaz de simbolizar todo o conflito. O estômago, por exemplo, pode ser um sítio dos problemas num paciente com desejos de independência frustrados, devido a sua associação aos processos de alimentação e carinhos maternos. Ao mesmo tempo, o sintoma pode constituir expressão concreta de uma idéia inaceitável.
          Um homem poderá vomitar porque sua mulher lhe causa asco; Uma jovem pode imaginar inconscientemente que os bebês se desenvolvem no estômago, o que levará a sofrer de dores aí durante a gravidez.
          O simbolismo é portanto, considerado o principal responsável pela escolha de sintomas. Em nosso inconsciente são alteradas todas as regras da lógica, intelecto e razão da mente consciente. Uma pessoa, coisa ou situação podem ter sido representadas por um símbolo, por alguém ou algo similar, ou mesmo por algo que lhe seja imposto. Esta é a linguagem do inconsciente.
          Uma pessoa assustada, o seu coração bate mais depressa, os vasos sanguíneos de sua pele se contraem, os músculos se contraem e assim por diante. E, no entanto, uma doença psicossomática caracteriza-se , sobretudo, pela exacerbação de uma ou duas de tais reações, havendo um relativo desprezo das demais. Acredita-se que ocorra uma exacerbação de uma ou mais partes de uma reação total, com a relativa exclusão das demais, devido a razões simbólicas e também fruto do acaso. Na verdade concluímos que a Psicanálise deve agir de forma Investigativa, só assim poderemos chegar a conclusões precisas sobre se é ou não uma doença psicossomática..
           Observação importante: Hipocondria – só existem sintomas; Psicossomática - existem os males orgânicos (no soma), influenciados diretamente pela mente.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Gravidez Psicológica

Gravidez psicológica é o que chamamos de barriga de mentira.

O que é? e por que isso acontece?
          Em linhas gerais, a gravidez psicológica é uma fantasia delirante. A mulher acredita que está grávida e a ‘prova de realidade' (a confirmação médica de que não existe bebê algum) não tem nenhum valor para ela. Enfatizo que esta gravidez não é uma mentira para a mulher, ou seja, ela pensa de verdade que está esperando um bebê e o seu corpo confirma.
          São muitos os motivos - Dificilmente a gravidez psicológica acontece por uma única razão. Cada pessoa reage aos problemas de uma maneira particular e qualquer transtorno psicológico tem diversas causas.

Exemplos:
• Baixa auto-estima,
• Sentimentos de rivalidade intensa,
• Insegurança,
• Ciúme em excesso,
• Baixa capacidade de lidar com as frustrações, além de um forte desejo de ter um filho são algumas delas.
• Pressão pelo marido e pela família a ter um filho – Isto pode acabar gerando um bebê de mentira.
• Também há situações em que a mulher quer garantir a estabilidade do relacionamento e pensa que um filho é a solução, como no caso da Simone.

Qual é a resposta do corpo?
          Por mais incrível que pareça, a mulher que vive uma gravidez imaginária pode sentir na pele o mesmo que sentem as futuras mães de verdade – Nossa mente é muito forte! A gravidez psicológica tem origem mental, mas o corpo responde.

Quais os sinais?
          Muitas sentem enjôo, têm desejos, apresentam crescimento do abdômen e dos seios, e, em alguns casos raros, é possível até produzirem leite – Isto é comprovado pelos ginecologistas e obstetras. O aumento da barriga, neste caso, fica por conta da comilança - Como elas acham que estão grávidas, pensam que deve comer por dois. O que acontece é o acúmulo de gordura no abdômen e nos seios. Além disso, muitas confundem os gases e movimentos naturais do intestino com o bebê se mexendo no útero.

Quem são as mulheres mais propensas a desenvolver uma gravidez psicológica?
          Apesar de o problema também surgir em mulheres jovens, é mais comum que isso aconteça com pessoas mais velhas, próximas à menopausa, inférteis e com distúrbios hormonais que interferem na menstruação.

Até quando vai a farsa?
           É possível a mulher acreditar na mentira de que vai ser mãe até chegar a hora do parto.

Como se sentem as mulheres que, de repente, descobrem que o bebê que tanto esperavam não existe?
          São variáveis as reações. Algumas mulheres até sentem alívio quando descobrem que não estão grávidas, mas em geral a reação é de susto e de decepção.

Qual o tratamento?
          • Carinho e terapia
          • É a psicoterapia o tratamento possível para curar a “falsa gravidez”.
          • Em geral, essas mulheres não procuram ajuda psicológica, pois se procurarem o terapeuta estarão admitindo que não tem o bebê. Por isso, é essencial o apoio da família, antes e após a aceitação do fato. E, tão importante quanto aceitar a realidade de que não está grávida, é ter certeza de que ela não precisa de um filho para se sentir amada.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Mitomania "compulsão pela mentira"

         
          A mitomania é a tendência patológica mais ou menos voluntária e consciente para a mentira. Normalmente, as mentiras dos mitomaníacos estão relacionadas a assuntos específicos, porém podem ser ampliadas e atingir outros assuntos em casos considerados mais graves . Uma menina cujo pai é violento, por exemplo, pode começar a inventar para as colegas como sua relação com o pai é boa e divertida, contando sobre passeios e conversas que nunca existiram. Justamente pelos mitômanos não possuírem consciência plena de suas palavras, os mesmos acabam por iludir os outros em histórias de fins únicos e práticos, com o intuito de suprirem aquilo de que falta em suas vidas. É considerada uma doença grave, necessitando o portador dela de grande atenção por parte dos amigos e familiares.

Sobre a doença
          Dizer a verdade é um sofrimento para quem tem mitomania, doença definida como uma forma de desequilíbrio psíquico caracterizado essencialmente por declarações mentirosas, vistas pelos que sofrem do mal como realidade.
          Desse ponto de vista, podemos dizer que o discurso do mitômano é muito diferente daquele do mentiroso ou do fraudador, que tem finalidades práticas. Para estes, o objetivo não é a mentira, sendo esta apenas um meio para outros fins. Contam histórias ao mesmo tempo que acreditam nelas. É também uma forma de consolo.
          Esse distúrbio tem sua origem na supervalorização de suas crenças em função da angústia subjacente. Muitas vezes as mesmas se apresentam unidas à angústia profunda, TOC, depressão e pós depressão.
          De um lado, o mitômano sempre sabe no fundo que o que ele diz não é totalmente verdadeiro. Mas ele também sabe que isso deve ser verdadeiro para que lhe garanta um equilíbrio interior suficiente. Em determinado momento, o sujeito prefere acreditar em sua realidade mais que na realidade objectiva exterior. Ele tem necessidade de contar essa história para se sentir tranquilizado e de acordo consigo mesmo.
          A mitomania não pode ser considerada como uma mentira compulsiva, e sim como uma doença que se não tratada pode causar transtornos sérios à pessoa que possui. Em geral, essa manifestação deve-se à profunda necessidade de apreço ou atenção.
         A maioria dos casos de mitomanía, ao serem expostos, tornam-se vergonhosos. Todavia, os mitômanos que buscam ajuda por vontade própria, pedindo a seus familiares e principalmente aos seus amigos, são considerados extremamente raros, pois eles veem que estão sofrendo de um mal e desejam acima de tudo curar-se. O papel dos companheiros se torna extremamente importante na vida do indivíduo que sofre da doença, já que eles que irão indicar os pontos e erros.
          Grande parte dos casos de mitomania levam ao suicídio, principalmente se associados a depressão e pós depressão. O indivíduo ao não obter o apoio necessário e ser excluído daquele grupo que frequentava ou participava acaba por vivenciar uma situação sem saída, isto é, o mesmo acaba por ser excluído de seus gostos e vê-se sem aquilo que ama e deseja. Casos comuns demonstram que mitomaníacos envergonhados de si, pelo porte de sua doença, infligem-se o óbito quando abandonados por amante, que não compreendem a sua doença e o abandonam, não acreditando na possibilidade de uma cura ou não restabelecendo os laços afectivos de antes.
         Aconselha-se aqueles que rodeiam o mitômano, principalmente se o mesmo obteve uma conversa clara expondo a sua vontade de melhora, a não largarem-no, podendo tal atitude acarretar desejos inconstantes, profunda melancolia, depressão e desejo de suicídio da parte do mitomaníaco. Inicialmente o mesmo apresentará sintomas de solidão e grande desejo de estar acompanhado daqueles que ama. Contudo, ao ver que isso não é possível, acaba optando pelo desejo de morte.
Motivação
          Não se sabe ao certo os motivos pelos quais a mitomania se manifesta. Primeiro, porque acarreta milhares de fatores sócio-psicológicos da pessoa afetada e, segundo, porque enfatiza uma situação social, podendo, então, mostrar-se eventual dependendo das circuntâncias presentes na época em que o indivíduo está vivendo. Na maioria das vezes é por desejo de aceitação daqueles que o rodeiam.
Cura
          A cura do indivíduo reside muitas vezes na implementação de um quadro de cuidados que associa o tratamento em meio psiquiátrico do problema subjacente a um acompanhamento psicoterapêutico. Tal acompanhamento torna-se a parte mais importante, sendo realizado pelas pessoas que rodeiam o mitômano e que o mesmo requisitou para ajudá-lo. É importante nunca negar ao mesmo tal acompanhamento, sendo este a chave para a cura, até mais importante que um tratamento psiquiátrico.

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Transtorno de Personalidade Borderline


 Seqüelas de abuso na infância

          Borderline é um transtorno de personalidade que traz sérias conseqüências para a pessoa, seus familiares e seus amigos próximos. O termo "fronteiriço" não se refere ao limite entre um estado normal e um psicótico. Ele se refere a uma instabilidade constante de humor.
          Não é muito freqüente. Nos USA se considera 2% da população, (mas cuidado, geralmente as estatísticas lá são exageradas). Muito mais freqüente em mulheres do que em homens (por isso a página é escrita no feminino).
1) Sintomas (claro que nem todas as Borderline tem todos estes sintomas):
     • Medo de abandono: uma necessidade constante, agoniante de nunca se sentirem sozinhas, rejeitadas e sem apoio.
     • Dificuldade de administrar emoções
     • Impulsividade.
     • Instabilidade de humor. As oscilações de humor do DAB ou TAB - Distúrbio ou Transtorno Afetivo Bipolar duram semanas ou meses, mas as Borderline têm oscilações de minutos, horas, dias. Essas oscilações de humor incluem depressões, ataques de ansiedade, irritabilidade, ciúme patológico, hetero- e auto-agressividade. Uma paciente marca a consulta informando que está super deprimida, querendo morrer. No dia seguinte chega à consulta bem humorada, bem vestida, maquiada, vaidosa.
     • Comportamento auto-destrutivo (se machucar, se cortar, se queimar). As portadoras de Borderline dizem que se machucam para satisfazer uma necessidade irresistível de sentir dor. Ou porque a dor no corpo "é melhor que a dor na alma".
     • Tentativas de suicídio, mais freqüentemente as de impulso do que as planejadas.
          • Mudanças de planos profissionais, de círculos de amizade.
          • Problemas de auto-estima. Borderlines se sentem desvalorizadas, incompreendidas, vazias. Não tem uma visão muito objetiva de si mesmos.
          • Muito impulsivas: idealizam pessoas recém conhecidas, se apaixonam e desapaixonam de maneira fulminante.
          • Desenvolvem admiração e desencanto por alguém muito rapidamente.
         • Alta sensibilidade a qualquer sensação de rejeição. Pequenas rejeições provocam grandes tempestades emocionais. Uma pequena viagem de negócios do namorado ou marido pode desencadear uma tempestade emocional completamente desproporcional (acusações de rejeição, de abandono, de não se preocupar com as necessidades dela, de egoísmo, etc.).
          • A mistura de idealização por alguém e a extrema sensibilidade às pequenas rejeições que fazem parte de qualquer relacionamento são a receita ideal para relacionamentos conturbados e instáveis, para rompimentos e estabelecimento imediato de novos relacionamentos com as mesmas idealizações.
          • Mais raramente, episódios psicóticos (se sentirem observadas, perseguidas, gozadas, comentadas).

2) Risco aumentado para:
          • Compras Compulsivas.
          • Sexo de risco.
          • Comer Compulsivo, Bulimia, Anorexia.
          • Depressão.
          • Distúrbios de Ansiedade.
          • Abuso de substâncias.
          • Transtorno Afetivo Bipolar.
          • Outros Transtornos de Personalidade.
          • Violência (não só sexual), abusos e abandono, por causa da impulsividade e da falta de crítica para escolher novos parceiros.

3) A causa provável é uma mistura de:
          • Vivências traumáticas (reais ou imaginadas) na infância, por exemplo abuso psicológico, sexual, negligência, terror psicológico ou físico, separação dos pais, orfandade.
          • Vulnerabilidade individual.
          • Stress ambiental que desencadeia o aparecimento do comportamento Borderline.
          • Cuidado com conclusões precipitadas do tipo "você foi abusada" ou "você foi aterrorizada".

4) Evolução:
          • Geralmente começa a se manifestar no final da adolescência e início da vida adulta.
          • Com o passar dos anos existe uma diminuição do número de internações hospitalares e de tentativas de suicídio.
          • Parece piada de mau gosto, mas é uma realidade estatística: a cada tentativa de suicídio que a Borderline sobrevive, diminui a chance de uma nova tentativa.

5) Fatores de bom prognóstico:
          • Bons relacionamentos familiares, sociais, afetivos, profissionais.
          • Participação em atividades comunitárias: igrejas, clubes, associações culturais, artísticas, etc.
          • Baixa ou ausente freqüência de auto-agressão.
          • Baixa ou ausente freqüência de tentativas de suicídio.
          • Ser casada.
          • Ter filhos.
          • Não ser promíscua.

6) Tratamento.
          A integração de tratamentos medicamentosos mais psicoterápicos trouxe grandes progressos no tratamento do Transtorno Borderline.

          • Medicação:
          O tratamento medicamentoso inclui Estabilizadores de Humor (mesmo que não se trate de DAB), pois eles ajudam a conter a impulsividade e as oscilações de humor.
          Antidepressivos e Tranqüilizantes não tem a mesma eficácia que teriam em casos de depressões ou ansiedades "puras", mas certamente tem sua utilidade em Borderline.
          Embora a medicação seja muito importante, ela é ator coadjuvante. O ator principal no tratamento é a Psicoterapia.

          • Psicoterapia:
          As mais úteis são as Psicanalíticas. Não é uma terapia fácil. O que acontece "na vida real" acontece dentro do consultório: instabilidade, alternância de amor e ódio, idealização e desapontamento com o terapeuta, sedução, impulsividade, etc. Isso quer dizer o seguinte: o tratamento exige paciência, persistência, disciplina, boa vontade, etc.



segunda-feira, 24 de maio de 2010

Não é bem isso o que eu queria dizer...

     
           Alguns estudiosos da linguística defendem que o sentido das palavras só existe na medida em que há uma contraposição, uma diferença, uma outra possibilidade, uma particularidade. Nomear é diferenciar.
          Parece estranho, mas não é. Toda afirmação existe em oposição a uma não-afirmação, mais especificamente a uma negação.
          Muitos devem se lembrar daquele bebê da Família Dinossauro que invocava o papai Dino como "Não-é-a-mamãe". O "pai" só aparece por ser outro que não a mãe.
          Aprendemos com René Spitz em seu livro "O não e o sim" (No and yes. On the Genesis of Human Communication. International Universities Press, Inc. New York, 1957) que a primeira palavra com sentido semântico pleno utilizada pela criança é o NÃO, embora muitos pais e mães se encantem com os balbucios de seu filhote (papá, mamã) e disputem qual deles foi primeiramente nomeado.
          O conversar comum, cotidiano, progride e se prolonga através de mal-entendidos, desmentidos e correções, logo seguidas de novos dizeres, cada vez mais necessários: "Não é bem assim", "O que eu queria dizer mesmo é...", "Você não entendeu direito", "Exatamente o que aconteceu?", "Quando falei tal coisa, é porque...", "Como assim? Explique melhor"...
          Neste pequeno texto que estou escrevendo, cada parágrafo procura reforçar o anterior, re-afirmar a idéia, prevenir possíveis distorções no entendimento, convencer pela repetição, demonstrar o que foi dito, etc. A linguagem, definitivamente, é capenga e insuficiente para dizer tudo...
          Já em 1901, Freud publicou um delicioso artigo, intitulado Psicopatologia da vida cotidiana (Psychopathology of everyday life), no qual aborda o tema dos atos falhos.
          O conceito de ato falho (Fehlleistung, em alemão) não constava nos manuais de Psicologia e foi inventado por Freud. Na tradução inglesa, traduziu-se como parapraxis (parapraxia, em português).
          [Parapraxia, segundo o Houaiss, é um termo originado diretamente do grego, pela justaposição do prefixo "par(a)" com o substantivo "praxis" = ação. "Par(a)" tem muitas acepções: 1) 'proximidade': parágrafo, paraninfo, paratireóide, parenteral, parêntese, parótico, parótida; 2) 'oposição': paranomia, paradoxo; 3) 'para além de': parapsicologia, parapsíquico; 4) 'defeito': parafasia, paralexia, paramimia, paramnésia, paraplegia; 5) 'semelhança': parastaminia, parastêmone, parastilo].
          Na tradução brasileira das Obras Completas de Freud (Edição Standard, Editora Imago), encontramos a expressão ato falho, que pode ser, por exemplo, o esquecimento de algo importante, de um nome, o desvio em um trajeto predeterminado, a troca de palavras, etc. Distingue-se do erro comum, fruto da ignorância, imperícia ou conveniência. Ao cometer um ato falho, ninguém pode dizer "Eu não sabia" nem é possível renegá-lo: cai-se o véu, desvela-se algo oculto.
          Os atos falhos são também conhecidos como lapsos (do latim, lapsus = escorregar, escapar) , aparecendo em compostos:
           • Lapsus linguae = erro acidental ao falar, que altera o sentido que se pretendia dar à frase e que é interpretado (por influência da psicanálise) como expressão de pensamentos reprimidos;
          • Lapsus calami = erro acidental ao escrever (do latim, calamus = caneta, pena com que se escreve);
          • Lapsus memoriae = falta de lembrança; recordação defeituosa ou inexata.
          A descoberta freudiana do significado dos atos falhos é tão importante quanto sua teoria acerca da Interpretação dos Sonhos.
          Elementos dos sonhos e das parapraxias são indicadores de que existem conteúdos inconscientes, reprimidos, que saltam à luz por uma falha nas defesas do sujeito. Portanto, são um caminho privilegiado para o entendimento da vida psíquica normal, assim como as descobertas anteriores permitiram a Freud teorizar sobre as neuroses.
           Psicopatologia da vida cotidiana foi muito valorizado pelo criador da Psicanálise pois, segundo ele, "seria imune a objeções, já que os atos falhos eram fenômenos experimentados por qualquer pessoa normal".
          O artigo é muito interessante, tem uma linguagem clara e acessível, ilustrada com uma série infindável de exemplos. Há o orador que, ao abrir uma sessão solene, diz: "Tenho muito prazer em encerrar esta sessão!", deixando evidente seus desprazer em estar ali.
          A tese central de Freud é que os atos falhos, incluindo-se os lapsus linguae, são determinados por elementos que o sujeito não pretendia enunciar e seu significado oculto só aparece justamente na hora em que escapa ao controle da repressão. Assim, no velório, o cunhado diz para a viúva: "Meus parabéns", ao invés de dizer: "Meus pêsames". São eventos tão comuns e óbvios, por isso Freud os inclui como exemplos da psicopatologia da vida cotidiana.
          O enunciante é surpreendido pelo que acaba de falar. Pode até ocorrer que ele não perceba, mas o interlocutor não deixará passar em branco. Pode provocar risos ou desconcerto, dependendo do conteúdo revelado.
          O conceito de ato falho já caiu no domínio do senso comum, ou seja, quando alguém diz sim, querendo dizer não, o que vale é o sim! Vale o dito.
Elucubrado por Claudio Costa



quarta-feira, 28 de abril de 2010

“ONDE HOUVER ID, HAVERÁ EGO”

  *       

          O centro do pensamento de Freud era que a subjetividade do homem é, de fato, determinada pelos fatores objetivos – Objetivos na medida em que se relacionam à própria consciência do homem – e que agem a revelia dele, por assim dizer, determinando-lhe pensamentos e sentimentos, e assim, indiretamente, seus atos. O homem, tão zeloso de sua liberdade de pensar e escolher, é na realidade, uma marionete movida pelos cordéis, atrás e acima dele, e que por sua vez são dirigidos por fatores desconhecido de sua consciência.
          Para dar-se a ilusão de que age segundo sua vontade, o homem inventa racionalizações que lhe dão a impressão de agir como age, por ter escolhido livremente a sua atitude, movido por motivos racionais ou morais. Mas Freud não conclui com uma nota de fatalismo, confirmando a incapacidade do homem em relação às forças que o determinam, e sim, que o homem pode adquirir consciência dessas forças que atuam a sua revelia – e com isso ampliar o âmbito de sua liberdade e transforma-se de um joguete movimentado por forças inconscientes, num homem livre e consciente, determinando seu próprio destino. Freud expressou esse objetivo nas palavras “ONDE HOUVER ID, HAVERÁ EGO”.
          Uma questão curiosa que não podemos deixar de lado é que todas essas características que julgamos naturais e inerentes ao ser humano são, na realidade, frutos de sentimentos reprimidos na infância, que concomitantemente reflete na fase adulta, sob a ação dos fatores: Antropológicos (FA), Biológicos (FB) e Psicológicos (FP). A finalidade da ação destes fatores é levar o indivíduo a ter um conceito inferior de si mesmo. Relembro o que diz o mestre Ariosto Mota: “A consciência deve dar ao indivíduo a noção de que ele deve lutar por si mesmo, visto que, ela existe não para tornar negra a sua vida interior, mas para libertá-lo. Se você não for por você quem será?”
                                                                                  (Oliveira, Jorge Luiz Souza de)

quinta-feira, 1 de abril de 2010

A compulsão pelo poder


Em primeiro lugar, convido o leitor a deixar de lado a questão moralista que logo vêm à mente quando falamos sobre o tema da compulsão. Se desmembrarmos a palavra, temos o prefixo “com” seguido da palavra “pulsão”, que significa desejo. O desejo é a raiz da tenacidade, da vontade de lutar para conseguir algo. A Vontade de Poder no pensar de Winnicott, sábio psicanalista inglês, é um impulso constante e irrefreável, tomado como um paradigma de sentir-se vivo e o que nos move para realizar nosso propósito de sobrevivência. As pessoas que exercem papéis dominantes no mundo têm geralmente um imenso potencial de vida que pode conduzir a um perfil de tenacidade e de auto determinação. Tomemos o exemplo de empresários de vários setores da economia que construíram impérios num Brasil onde tudo era quase incipiente. Ou Barack Obama, que jamais teria vencido as eleições se não possuísse em certa medida um aspecto compulsivo, que o fez ser capaz de dormir apenas três horas por noite durante um mês inteiro de campanha.
        Mas, embora exista um lado positivo dos traços compulsivos, esse caminho varia bastante e pode eventualmente enveredar para um comportamento psicopatológico.  Isso se dá quando uma pessoa afunila o leque de possibilidades de realização de seu desejo. Para a psicanálise, é essencial investigarmos como se deram as primeiras experiências de afeto e de vínculo de um paciente, pois estas experiências serão pela vida afora os protótipos da noção do que é valoroso para cada si mesmo. De uma forma simples, a experiência do leite materno, valioso não só como alimento, mas como fonte de amor e carinho, deixa suas marcas como modelo do que se pode desejar e buscar.
A compulsão doentia caracteriza-se como uma busca frustrada de preenchimento de algum vazio afetivo. Como exemplo, um empresário pode usar sadiamente sua atividade profissional para preencher de alguma forma sua vontade de ser feliz. Mas se o trabalho for apenas um meio de dominação para sentir-se poderoso, este poder será vazio de satisfações mais profundas e consistentes. Nesse caso, o poder não é um alimento para a mente que acaba se estreitando pelas contínuas decepções e levando muitas vezes à completa desesperança . Mesmo pessoas que lideram grandes impérios podem entrar por essa via torta. Se observarmos a crise econômica atual, talvez ela tenha em suas raízes uma compulsão pelo dinheiro, com interesses unicamente financeiros, ultrapassando os limites do que é plausível.
As patologias ligadas a compulsões intensas não dependem da situação socioeconômica do individuo. As violências gratuitas são exemplos disso. Apenas talvez os mais ricos tenham mais meios de disfarce para o sofrimento, expressado então, em atos compulsivos, como compras exageradas, coleções de sapatos, de arte indiscriminada, de parceiros sexuais. Porem o preço que se paga nessa tentativa de apaziguamento da dor é muito alto, desde que vai afastando o sujeito, cada vez mais, de sua dor genuína. Também a necessidade de manutenção de uma boa imagem social é mais freqüente entre os das classes mais altas, ainda que não corresponda aos seus desejos genuínos. Dessa necessidade derivam vários dos comportamentos compulsivos atuais como exigências de boa silhueta, de não sofrimento, de sinais aparentes de riqueza etc.
Muitas vezes em nossos consultórios nos deparamos com pacientes que aparentam ser insensíveis à família, aos que os rodeiam ou à problemática social. O que existe de fato é muito sofrimento encoberto pela concepção de que seu status de poder seria abalado caso entrassem em contato com suas angustias, pois seriam dominados por suas sensibilidades afetivas em detrimento da realidade dos fatos e de suas racionalidades.  A experiência clinica demonstra o contrario, pois o processo analítico ao ampliar as ferramentas de sobrevivência também amplia as condições de maior desenvoltura financeira.
Os medicamentos disponíveis sem duvida facilitam o controle da angustia subjacente aos atos compulsivos, mas a meu ver o tratamento de pessoas com alto grau de compulsividade deve passar pelo resgate e revisão profunda dos meios utilizados para a obtenção do sentimento de poder de estar vivo assim como de melhor qualidade vida.   
Maria Olympia França é psicanalista, membro docente da Sociedade Brasileira de Psicanálise e representante na comissão de ética da IPA – International Psichoanalitical Association. Seu trabalho “Freud, Cultura Judaica e Modernidade” obteve o premio Jabuti 2004 na categoria Educação, Psicologia e Psicanálise. 

Por Maria Olympia França